março 27, 2008

Ivo Andrić, ‘A Ponte Sobre o Drina‘: um excelente romance histórico sobre os Balcãs do século XVI ao início do século XX


É ao escritor e diplomata jugoslavo, Ivo Andrić, prémio Nobel da Literatura em 1962, nascido no final do século 1892 em Dolac, perto de Travnik, na Bósnia, que se deve um excelente livro de ficção histórica A Ponte sobre o Drina, originalmente publicado em servo-croata em 1945 (só em finais de 2007 apareceu a tradução em língua portuguesa...). Nesta original obra de literatura, a narrativa ficcional, que decorre sobretudo à volta de pequenos episódios da vida quotidiana, liga-os a factos históricos marcantes da Bósnia e dos Balcãs. A imaginação literária de Ivo Andrić transformou a ponte sobre o Drina - situada na pequena cidade de Višegrad, na fronteira entre a Bósnia e a Sérvia, na actual Republika Sprska - , no fio condutor de uma curiosa narrativa. Esta acompanha a rica e conturbada história da região, e situa-se no período após a conquista otomana feita no século XV. O início ocorre no século seguinte com os trabalhos de construção da ponte - uma obra arquitectónica hoje considerada património mundial pela UNESCO -, mandada construir pelo vizir Mehmed Paša Sokolović a suas expensas. Esta construção simbolizava a ligação do vizir às suas origens: Sokolović tinha sido arrancado à sua família, quando era criança, ao abrigo do "imposto de sangue" (devşirme) a que os cristãos dos Balcãs estavam obrigados pelo poder otomano muçulmano. Após a construção da ponte os acontecimentos fluem ao longo dos séculos seguintes, até à chegada dos áustro-hungaros no ultimo quartel do século XIX (1878) e aos acontecimentos trágicos da I Guerra Mundial (1914-1918). Na origem do trabalho literário concebido por Ivo Andrić detecta-se não só a influência marcante da tradição oral e dos relatos históricos de cariz popular que se podiam encontrar na sua Bósnia nativa, como a turbulência dos acontecimentos políticos que marcaram toda a sua existência. Ao longo da sua vida, Andrić assistiu ao fim dos impérios que governavam a maioria dos Balcãs – o Império Otomano e o Império Austro-Húngaro – passou por duas guerras mundiais e conheceu três "nacionalidades": nasceu como súbdito da Áustria-Hungria até 1918; depois foi cidadão do Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos, mais tarde designado por Jugoslávia; quando, faleceu, em 1975, era cidadão da República Socialista Federal da Jugoslávia, (re)fundada por Josip Broz (Tito) no pós II-Guerra Mundial; se tivesse podido viver até finais do século XX, teria ainda tido uma quarta "identidade", devido à metamorfose regressiva dos jugoslavos em eslovenos, croatas, bósnios, macedónios, montenegrinos, sérvios, kosovares etc., a partir de 1991.
JPTF 2008/03/27

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