fevereiro 20, 2008

O Arcebispo, a Sharia, Adam Smith e a Democracia


Ao lermos o livro de Callum G. Brown, "The Death of Christian Britain" (A Morte da Grã-Bretanha Cristã, Routledge, 2000), vêem-nos à mente as recentes declarações do Arcebispo de Cantuária a favor da introdução da Sharia islâmica no Reino Unido. Face à tese sombria do livro sobre o futuro do Cristianismo, o leitor mais ingénuo terá suposto que o líder da Igreja Anglicana estaria extremamente preocupado com a situação de diminuição do número de fiéis no culto e com a perda de vitalidade cristã na sociedade. Todavia, nenhuma destas banalidades terrenas parece preocupar Rowan Williams. O que importa mesmo, segundo parece, é a ideia visionária que teve sobre a introdução da Sharia islâmica, para já em matéria de família, a qual, segundo este, melhoraria a "integração dos muçulmanos britânicos". Podemos imaginar os efeitos desastrosos que um personagem com este perfil teria à frente de uma empresa ou organização com o objectivos de cumprir a sua missão e prosperar, onde a melhor ideia que conseguia ter era... "oferecer o mercado" à concorrência. Felizmente para os accionistas da empresa ou associados da organização, certamente já teria sido despedido. Infelizmente para os anglicanos, vão ter de continuar a aguentar um líder cujo nome, tudo indica, vai ser um referência obrigatória para futuras gerações de historiadores quando tratarem o tema da "morte do Cristianismo" britânico. Mas não é só o Arcebispo de Cantuária que denota esta forma singular de pensamento estratégico, que derrota a própria organização da qual (deveria ter) a responsabilidade de fazer prosperar. Alguns elementos do governo de Gordon Brown, como o responsável pelo tesouro Alistair Darling, mostram propensão para similares medidas visionárias, ao prepararem, longe do escrutínio do cidadão comum, o lançamento de um empréstimo especial obrigacionista de acordo com a Sharia islâmica. Este será sancionado por uma fatwa de um ulema muçulmano e, por isso, livre do "pecado" capitalista dos juros, permitindo ao tesouro britânico financiar-se junto de países do Médio Oriente e, aparentemente também com o argumento de melhorar a "integração dos muçulmanos britânicos" (não é difícil imaginar o coro de protestos que se levantaria, se similar empréstimo tivesse de ser feito com a benção da Igreja - um retrocesso civilizacional, sem dúvida). Já sabíamos que o capitalismo não tem problemas éticos, nem religiosos, com ditaduras de direita (o Chile de Pinochet), nem com ditaduras de esquerda (a actual China comunista). Ficamos agora a saber que também não tem problemas éticos, nem religiosos, com teocracias islâmicas (Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Qatar, etc.). Todavia, este crescente divórcio entre o capitalismo e a democracia liberal é um sintoma preocupante, que não augura nada de bom para o futuro das sociedades democráticas, abertas e pluralistas do Ocidente. Não será por isso grande surpresa se, no país de Adam Smith, o clássico "A Riqueza das Nações" for reescrito para compatibilizar o furor capitalista multicultural britânico com a Sharia islâmica. Não é só o Cristianismo que está lentamente a degenerar e a morrer nas ilhas britânicas, mas também a democracia liberal e secular tal como a conhecemos.
JPTF 2008/02/20

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