setembro 21, 2008

Da genuína tolerância liberal ao míope ‘tolerismo‘ pós-moderno


Recentemente, o jurista e escritor canadiano de ascendência judaica, Howard Rotberg, cunhou o conceito de «tolerismo» (tolerism) por oposição ao conceito moderno e liberal de tolerância, que historicamente se afirmou na cultura europeia e ocidental, a partir das guerras religiosas do século XVII. O tolerismo pós-moderno, surge, assim, como uma elevação ao extremo da ideia liberal tolerância, ao ponto de a distorcer, tornando-se quase uma caricatura desta. As suas principais características são: i) deixar-nos propensos a tolerar o aquilo que seguramente deveria ser intolerável; ii) criar nos seus proponentes um sentimento de superioridade moral que, paradoxalmente, gera intolerância para discutir, ou até para ouvir, pontos de vista que não os seus. Mas o mais brilhante diagnóstico deste míope «tolerismo» pós-moderno, o qual, ainda que de forma involuntária, acaba por abrir a porta à intolerância, ao totalitarismo e ao fundamentalismo religioso, foi efectuado por Ernest Gellner, no seu livro Pós-Modernismo, Razão e Religião (1992). Este excerto do livro retrata deliciosamente a «boa ideologia» que todo o indivíduo «educado», com pretensões eruditas, e, sobretudo, políticas, deve hoje adoptar (pag. 106): «[No Ocidente] temos um movimento que nega a própria possibilidade de uma legitimação e autoridade extrínseca. De comum acordo, insiste particularmente nesta negação quando a afirmação contrária dessa legitimação extrínseca provém do interior das suas fileiras, de não-relativistas no seio da sua própria sociedade. Por outro lado, o pudor relativista e a expiação da culpa ex-colonial não permitem que o assunto seja devidamente enfatizado junto dos membros pertencentes a outras culturas. O absolutismo dos outros recebe um tratamento favorável e é objecto de uma grande simpatia que está muito próxima do apoio oficial».
JPTF 2008/09/21

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